Desde o primeiro vestibular, realizado em 1920, a Universidade Federal
de Pernambuco (UFPE) já formou mais de 10 mil profissionais no curso de
Medicina. Os alunos estudam no Centro de Ciências da Saúde da
universidade com o apoio do Hospital das Clínicas, que atende a todas as
especialidades. São oferecidas 70 vagas por semestre no campus Recife.
O curso tem duração de seis anos e recebeu cinco estrelas na avaliação
feita pelo Guia de Profissões GE 2014. Desde 2014, a UFPE também oferece
Medicina no campus de Caruaru, no interior do estado
A prática no hospital começa no quarto semestre. O curso está
organizado em ciclo básico (do primeiro ao quarto período) e em ciclo
clínico (a partir do quinto). O quarto período funciona como base para o
ciclo profissional. Os alunos primeiro começam a atender pacientes no
ambulatório e na enfermaria. No início, quando estão aprendendo, ficam
divididos em grupos com mais alunos e os professores estão sempre por
perto para ajudar. A partir do quinto, há mais independência, com
direito a plantões em alguns hospitais além do Hospital das Clinicas e
das maternidades da cidade, mas sempre supervisionados por monitores e
preceptores (médicos com atenção especial no ensino dos alunos).
- Leia mais sobre o curso e a carreira de Medicina
Até o oitavo período a maioria das aulas são teóricas. A atuação
clínica do internato em hospitais, maternidades e unidades de saúde
durante os dois últimos anos de curso é obrigatória. Nesse período
também são dadas aulas de discussão de caso, apresentação de seminários e
de alguns temas específicos, mas o que prevalece mesmo é a prática.
Para saber mais sobre o curso o GUIA conversou com Nathália Campello,
aluna da UFPE em Recife. Ela está no quinto semestre e foi aprovada
depois de dois anos se dedicando ao vestibular após formada no Ensino
Médio. Na entrevista ela conta os diferenciais que a fizeram optar pela
UFPE e mostra como é o dia a dia de um estudante de Medicina da
universidade.
GUIA DO ESTUDANTE: Você sempre quis ser médica?
Nathália Campello: Na verdade não. Decidi fazer
Medicina quando estava na oitava série e comecei a pensar no curso que
iria prestar vestibular. Fui pesquisando e me encontrei na Medicina. Na
época tinha um professor de biologia que era pediatra e me influenciou
bastante na escolha. Comecei a buscar mais informação sobre a carreira,
sobre o curso e não conseguia imaginar mais nada mais para minha vida.
Era Medicina que eu tinha que fazer mesmo… Ainda tentei “fugir” porque
sabia que o vestibular era complicado, que o curso era puxado e que a
vida profissional era muito cheia e exigia muito, mas não consegui.
GUIA: A UFPE sempre foi a sua escolha ou você prestou vestibulares para outras universidades também? Como você se decidiu?
Nathália: Bom, quando resolvi fazer Medicina não
quis tentar em nenhum outro local que não fosse em Recife. Não quis ter
que sair de casa e achava que as faculdades daqui (UFPE e UPE) eram
muito boas. Então, no vestibular só coloquei para essas duas faculdades.
Também não tentei nenhuma privada por achar o valor da mensalidade
muito alto e também porque achava que as públicas teriam melhor
qualidade de ensino e reconhecimento no mercado de trabalho. Consegui
entrar nas duas universidades, mas acabei escolhendo a UFPE. Durante
toda a minha vida, não me imaginada estudando na federal. Meu foco
sempre foi a UPE, mas na hora da matrícula não consegui deixar a UFPE de
lado. Conversei com alguns professores, alguns familiares que me
ajudaram nessa escolha.
GUIA DO ESTUDANTE: Como é estudar na UFPE?
Nathália: Sabia que lá eu ia encontrar muitos
professores ótimos e realmente eu encontrei. Principalmente os
professores do ciclo clínico, eles são muito bons! Mas outros não
possuem muita didática, só que isso a gente tem que aprender a lidar.
Esse foi um dos motivos que me deixou muito frustrada, principalmente no
primeiro período. Cheguei a pensar em desistir do curso. No início, até
por questão de imaturidade, eu diria. É tudo mais difícil. Conseguir se
adaptar com uma carga horária extensa e puxada não foi fácil. Havia
alguns professores muito inflexíveis e que faziam provas muito
exigentes… Mas com o passar do tempo, fui aprendendo as “manhas” com as
dicas dos alunos veteranos que facilitaram muito as coisas… Um outro
aspecto que ainda me frustra hoje em dia é a precariedade do nosso
hospital. Às vezes, por mais boa vontade que os professores ou que a
gente tenha em atender os pacientes, nem sempre é possível fazer tudo da
melhor forma ou da forma ideal. Isso é bem triste porque os pacientes
se prejudicam e os alunos também. Atualmente, tanto a faculdade quanto o
hospital estão com os servidores em greve e isso está dificultando
muito o aprendizado, pois as bibliotecas estão fechadas e sem as aulas
práticas nos ambulatórios, porque não há marcação de consultas, nem
acesso a prontuários médicos. A “ameaça” de que a qualquer momento possa
ter uma nova greve também assusta e me deixa bastante frustrada…
GUIA: Você lembra da sua matrícula? Os veteranos a receberam bem? E agora como veterana, você já participou de alguma recepção?
Nathália: Sim, fui muito bem recebida. Na UFPE não
temos o costume de fazer esses trotes que vemos em outras faculdades.
Pelo contrário! Temos o costume de que a turma anterior recepcione os
novos alunos desde o dia da matrícula. Lembro que prepararam cartazes
com brincadeiras sobre o curso, havia adereços de festa para tirarmos
fotos… Uma semana antes de iniciar as aulas, o diretório acadêmico
(formado por alunos de vários períodos) organiza uma semana para mostrar
tudo na faculdade: como funciona o esquema de atribuição de notas, onde
fica a biblioteca, onde almoçar, tirar xerox… Levam pessoas que
participam de projetos para que os alunos também possam entrar. E na
semana de aula essa turma anterior faz um café da manhã de boas-vindas.
Lembro que ajudei a organizar a recepção da turma que entrou depois da
minha. Fizemos o mesmo esquema e ainda mostramos um vídeo com as fotos
do pessoal que tinha passado, fotos de professores, do nosso dia a dia
estudando, nos divertindo e até dormindo em algumas aulas… Mas como uma
brincadeira de boas-vindas mesmo.
GUIA: Como é mexer com sangue? E com cadáveres? Tem aulas práticas desse tipo? Alguns alunos se assustam?
Nathália: Nós temos no primeiro ano a disciplina de
anatomia, com aulas teóricas e aulas práticas que são em cadáveres
mesmo. No início, alguns ficam um pouco receosos, mas são bem poucos.
Mas isso foi só no início depois todos se acostumaram. Na verdade, era a
cadeira mais interessante porque era a mais ligada ao corpo humano, à
Medicina em si… Não era tão teórico quanto fisiologia e bioquímica.
Todos gostavam. Com relação ao sangue, não há muito contato no começo. O
máximo que há são algumas práticas quando os alunos aprendem a
puncionar alguma veia… Nada muito “forte”. Lidar com sangue mesmo (algum
paciente sangrando, alguma cirurgia ou algo assim) é mais no ciclo
clínico, em que o aluno está mais preparado emocionalmente para lidar
com isso.
GUIA: Você diz que eles estão “mais preparados”
porque adquirem mais experiência na faculdade ou vocês têm alguma
matéria de Psicologia também para ajudar nisso?
Nathália: Acho que pelos dois. Em quase todo período
temos alguma cadeira que lida com temas humanísticos, para lidar com
dor, sofrimento. Então, falamos de vários assuntos, como aborto,
questões éticas como negligência, imprudência. Temas religiosos
(respeitar determinada crença, como agir frente a essas religiões mais
radicais) falamos de morte, de como devemos atender um paciente, sobre a
saúde do estudante de Medicina, como nos cuidar melhor (tanto físico
quanto emocionalmente), saúde do profissional médico. Como devemos
tentar lidar com determinadas situações… Coisas assim… Nem sempre é
fácil… Lá tem um grupo de apoio para os estudantes de medicina (NAEM),
formado por psicólogos e psiquiatras que também auxiliam um pouco nessa
questão de lidar com determinadas situações do curso e da grande carga
de estresse que ficamos submetidos. E também pela experiência. À medida
em que vamos vendo pacientes, aprendemos a lidar um pouco com esse
sentimento que pode surgir de medo, angustia… Ainda hoje me sinto muito
mal com determinados casos que vejo, mas a gente aprende a não
transmitir esse “medo” para o paciente, a agir da melhor forma na frente
dele para tentar amenizar a situação e buscar o melhor para ele e para
os familiares. Nem sempre é fácil, mas a gente vai tentando todo dia…
Vai aprendendo.
GUIA: Sobra tempo no meio de todas essas provas e clínicas para se divertir?
Nathália: Dá tempo! Mas quando começa o período de
provas aí fica complicado. Terminei o meu hoje (ufa!). Foram duas
semanas com prova quase todo dia… Se você conseguir se organizar, não
deixar assunto acumular, dá tempo para fazer tudo. O problema é
conseguir fazer tudo isso com antecedência… Mas sempre dá para ir para
algum canto com os amigos, assistir um filme… Algumas vezes fica
complicado quando temos plantão. Nesse semestre, peguei alguns no final
de semana… Mas confesso que acabo me divertindo nos plantões também…
GUIA: Por que você fala isso? Você passa por situações engraçadas por lá?
Nathália: Tem sim! Alguns pacientes são bem
engraçados. E realmente é bom ficar de plantão… Nós realmente
aprendemos. Ver alguns casos que só encontramos nos livros, ao vivo é
fascinante! E sempre tem algumas histórias hilárias de alguns pacientes,
ou até mesmo quando não tem “nada” para fazer e está tranquilo. Sempre
tem gente de outros períodos, outros lugares, médicos que ficam ajudando
a gente e que acabamos fazendo amizade, conversando… Também é uma forma
de “socializar”. Eu particularmente adoro… Até nas férias ou nos
domingos eu ia para um hospital aqui da cidade. Ficava de 7 da manhã até
as 7 da noite… Tirava 30 minutos para almoçar e já voltava pra
emergência. Realmente é algo que eu gosto de fazer. Então, para mim,
passou a ser diversão, apesar de que nem sempre as situações são fáceis
ou das mais agradáveis… Só de estar ali aprendendo e podendo fazer algo
para melhorar alguma coisa para alguém já me deixa feliz.
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